Sunday, July 20, 2003
Prolegómeno aos teus braços
Do céu tombam sombras por agora. Não corre brisa nem vento mas há um bafo gélido prestes a invadir as ruas e as casas. E uma luz disfarçada e tácita em refúgio para além do horizonte e do dia sobra um resquício diminuído: não deixa que as cores se afirmem como são. O fim da tarde é um país de sombras, as casas são cinzentas, as árvores são cinzentas e cinzentas e irreconhecíveis são as aves que esvoaçam. Cinzenta é a noite por agora. A noite que se apressa sobre os montes, nem noite escura, nem luarenta. Noite parda e cinzenta, madrasta e não há sequer uma memória do Verão, nem andorinhas, nem estrelas, nem foguetes estilhaçando estrelas.
Tenho frio. Um tremor miúdo em escala pelo corpo e sinto os pés formigar como se não fossem meus, como uma máquina que se agita. Tenho medo. Nunca te quis como a memória dos meus dias.
Outras passaram e como as estações deixaram a sua marca; umas viram-me florir, outras amadurecer. Outras viram-me amargar o futuro e envelhecer forçosamente, como um filho pródigo ou uma cria enjeitada. Encontrei-me criação infecunda de mim próprio, não me tinha como capaz de nada e aos poucos tornei-me nada mesmo e dei por mim a criar uma imitação dos dias, ornamentei-os com falsos propósitos e neles fui encalhando, menos sempre menos, nada cada vez mais nada.
Não consigo conceber pois forma menos cruenta de te querer senão como a presença de todos os meus dias. Não me chegam as memórias dos meus dias ou dos segundos nossos porque só tu, com o tudo que me dás, tornas expedito o meu caminho. E tornas-me cheio de tudo e não te quero como memória de dia algum, quero-te sim como eternidade.
Não quero que te lembres de me perguntar que grandiosas vitórias me ofereces. Não sei ao certo que te poderia responder que não me parecesse avulso e ilegítimo; que não me parecesse diminuto e parco. Basta que repares que um sorriso teu desperta em mim novo sorriso, basta que saibas que canto sem querer, que dou comigo a acreditar, que dou comigo a querer de novo mudar o mundo e sempre que sonho ser capaz de o mudar ele mostra-se-me como uma pintura esbatida, impressionista em cores e recortes, em formas e sentidos. Em tudo, menos em ti. Com tudo menos contigo.
Os teus braços são essa fonte moderna de revelação que faz com que o meu mundo de repente navegue numa corrente inimputável de força eu só pode ter como último destino o futuro, não o meu, mas o nosso: da nossa obra, dos nossos corpos, da nossa alma única. Não sei ser sem ti e este não sei ser sem ti é um ponto final, é uma necessidade absoluta, é uma jura de sangue sem mácula nem cicatriz. A maior é uma distância que só existe por existirem estradas e rios e morros e barrancos e instâncias que têm tudo de físico mas nada dizem quanto ao essencial.
O essencial radica latitude da tua felicidade: estás aqui. Continuas aqui. Estarás sempre aqui. Mais que o essencial, só os teus braços. Do céu tombam sombras por agora.
Do céu tombam sombras por agora. Não corre brisa nem vento mas há um bafo gélido prestes a invadir as ruas e as casas. E uma luz disfarçada e tácita em refúgio para além do horizonte e do dia sobra um resquício diminuído: não deixa que as cores se afirmem como são. O fim da tarde é um país de sombras, as casas são cinzentas, as árvores são cinzentas e cinzentas e irreconhecíveis são as aves que esvoaçam. Cinzenta é a noite por agora. A noite que se apressa sobre os montes, nem noite escura, nem luarenta. Noite parda e cinzenta, madrasta e não há sequer uma memória do Verão, nem andorinhas, nem estrelas, nem foguetes estilhaçando estrelas.
Tenho frio. Um tremor miúdo em escala pelo corpo e sinto os pés formigar como se não fossem meus, como uma máquina que se agita. Tenho medo. Nunca te quis como a memória dos meus dias.
Outras passaram e como as estações deixaram a sua marca; umas viram-me florir, outras amadurecer. Outras viram-me amargar o futuro e envelhecer forçosamente, como um filho pródigo ou uma cria enjeitada. Encontrei-me criação infecunda de mim próprio, não me tinha como capaz de nada e aos poucos tornei-me nada mesmo e dei por mim a criar uma imitação dos dias, ornamentei-os com falsos propósitos e neles fui encalhando, menos sempre menos, nada cada vez mais nada.
Não consigo conceber pois forma menos cruenta de te querer senão como a presença de todos os meus dias. Não me chegam as memórias dos meus dias ou dos segundos nossos porque só tu, com o tudo que me dás, tornas expedito o meu caminho. E tornas-me cheio de tudo e não te quero como memória de dia algum, quero-te sim como eternidade.
Não quero que te lembres de me perguntar que grandiosas vitórias me ofereces. Não sei ao certo que te poderia responder que não me parecesse avulso e ilegítimo; que não me parecesse diminuto e parco. Basta que repares que um sorriso teu desperta em mim novo sorriso, basta que saibas que canto sem querer, que dou comigo a acreditar, que dou comigo a querer de novo mudar o mundo e sempre que sonho ser capaz de o mudar ele mostra-se-me como uma pintura esbatida, impressionista em cores e recortes, em formas e sentidos. Em tudo, menos em ti. Com tudo menos contigo.
Os teus braços são essa fonte moderna de revelação que faz com que o meu mundo de repente navegue numa corrente inimputável de força eu só pode ter como último destino o futuro, não o meu, mas o nosso: da nossa obra, dos nossos corpos, da nossa alma única. Não sei ser sem ti e este não sei ser sem ti é um ponto final, é uma necessidade absoluta, é uma jura de sangue sem mácula nem cicatriz. A maior é uma distância que só existe por existirem estradas e rios e morros e barrancos e instâncias que têm tudo de físico mas nada dizem quanto ao essencial.
O essencial radica latitude da tua felicidade: estás aqui. Continuas aqui. Estarás sempre aqui. Mais que o essencial, só os teus braços. Do céu tombam sombras por agora.