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Thursday, October 30, 2003

Amanhã deixo-te um poema.
Mínimo ou máximo, como queiras
Ou mimos ou brincadeiras

Talvez o céu dê o tema
E nós sejamos estrelas. Eu e tu.

Amanhã deixo-te um poema que não queira rimar. Os poemas que querem rimar são maiores que quem os escreve e não digo que não os consiga escrever, mas não hoje, não aqui, não agora. O dia de hoje foi quase improdutivo por completo e, no entanto, estou cansado. Tenho sangue na boca que me arranha a garganta e que me faz apetecer cuspir para o chão como se cantasse uma melodia. Tenho saudades de todo o bem que há em nós só porque existimos. De como os dias e as coisas têm ritmo e rima quando a vida em nós cresce num abraço. Só para te dizer "Bom dia, amor. Lembro-me da tua voz".

Tuesday, October 28, 2003

Este post não é de hoje. Aguardava uma manhã para ser publicado. E delongou-se - como tudo em mim - por uma manhã e outra e outra até hoje. Hoje levantei me cedo, li vínte páginas para seminário, caminhei por Lisboa até encontrar um disco regravável à venda e agora te digo - este post é sobre promessas, como verás - que te passarei a escrever com mais calma e com mais vigor. Sem que isso seja uma promessa.

" Todas as promessas são um sofisma. Outros dirão – os mais pessimistas – que todas as promessas são mentiras por cumprir, desafios improváveis que o presente deposita no futuro e que o futuro, quando veste a inevitável pele do presente, acaba por confirmar como impossíveis e como tal falaciosos. Eu o confirmo para contigo pelas promessas que te fiz e que nunca cumpri, pelos dias em que não te deixei uma palavra que pudesse ser só tua e só nossa na forma imediata e expansiva que encontramos – este pedaço de coisa nenhuma e de tudo onde orbitam os nossos passos e os nossos medos – para limar as asas à distância.
Podem ser um sofisma, as promessas. Mas são um sofisma delicado e belo, um sinal dos caminhos possíveis, um prova de vontade. Não sei se entenderás estas palavras como um pedido de desculpas, uma remissão de consciência por te ter dito mais que uma vez que te escreveria dia após dia, nem que uma única palavra fosse, para que permaneças a parte de mim que a mim não pertence e sempre permanece. Antes de as julgares assim, às palavras, entende-as como um esgar sobre o latente, sobre a mensagem que uma simples promessa contêm para além de si mesma, para além do futuro vago ou ambicioso: só promete quem quer.
Dito assim, uma promessa pode muito bem não ser nada, mas pode também ser tudo. E é tudo na medida em que uma promessa é sobretudo um sonho: o desejo de que as coisas ocorram de uma ou determinada forma, de que tomem o rumo a que se aspira, antes de se consubstanciarem em projectos, formulam-se em promessas.
Promessas são pois sonhos com açúcar, com esperança. Quando prometes, dizes te a ti própria e dizes-me a mim que sonhas ficar comigo para sempre. E a felicidade possível cabe toda dentro das promessas que endereçamos um ao outro, mesmo que as promessas não ganhem um corpo e uma luz que brilhe só por si.
São nove e cinquenta e nove da noite e hoje é sábado. Escrevo-te num autocarro a bombordo da certeza, entre Lisboa e Coimbra, entre o tédio e a insónia. Não sei quando me lerás, nem que palavras poderei trocar contigo até lá. Por agora, prometo a mim mesmo continuar a prometer te a lua, o mar, todo o carinho que te possa dar. Poderei não cumprir, mas penso em ti. Sempre."

Tuesday, October 21, 2003

Meu amor que eu não sei. Amor que eu canto. Amor que eu digo.
Teus braços são a flor do aloendro.
Meu amor por quem parto. Por quem fico. Por quem vivo.
Teus olhos são da cor do sofrimento.
Amor-país.
Quero cantar-te. Como quem diz:

O nosso amor é sangue. É seiva. E sol. E primavera.
Amor intenso. Amor imenso. Amor instante.
O nosso amor é uma arma. E uma espera.
O nosso amor é um cavalo alucinante.

O nosso amor é um pássaro voando. Mas à toa.
Rasgando o céu azul-coragem de Lisboa,
Amor partindo. Amor sorrindo. Amor doendo.
O nosso amor é como a flor do aloendro.

Deixa-me soltar estas palavras amarradas
Para escrever com sangue o nome que inventei.
Romper. Ganhar a voz duma assentada.
Dizer de ti as coisas que eu não sei.
Amor. Amor. Amor. Amor de tudo ou nada.
Amor-verdade. Amor-cidade.
Amor-combate. Amor-abril.
Este amor de liberdade.

Joaquim Pessoa
, Amor Combate

Não era este que procurava nem sequer procurava um deste, mas quero que saibas que os teus olhos são mesmo da cor do aloendro e têm esse fado belo e tremendo de me fazerem querer-te sempre mais, esse fado perfeito de ser a perfeição, aquilo o que temos, mesmo com um futuro debruado de dificuldades à nossa frente sei que nada terei a temer. Sorte alguma e morte alguma.Só vida, como se dos teus lábios brotasse uma fonte e nos teus olhos encontrasse um leito.Estás-me no sangue, como um segredo de mim para mim.

Monday, October 20, 2003

Hoje é daqueles dias em que se sente a cabeça naufragar em lado
nenhum. Pescas um som aqui, um raio de luz ali e quando te apercebes
das coisas, não pescas é nada.
Gostei de te ler. Da forma bem disposta e ligeira como falaste dessas coisinhas pequeninas que te perguntava uma e outra vez. Nunca me fiz essa pergunta que te perguntas a ti tantas vezes, sabes? Como posso gostar de ti? Gosto. Muito. E é tudo. E é um tudo que me basta.
Porque me queres bem. Porque me fazes bem. Porque me lembras e fazes ver tudo o que é bom no mundo pérfido e sinuoso que nos rodeia.

Monday, October 06, 2003

No meio da avença e da desavença a que a impaciência dos carros e dos rostos condenam Lisboa, encontrei um pequeno paraíso. Compreenderás por certo que é para mim um pequeno paraíso quando te confiar que te escrevo de um local que tem os alicerces na escrita quase como a própria vida ou a sucessão das estações tem na negrícia da terra uma origem e um fermento.
Por entre livros te escrevo, de um segundo andar distante quanto baste do bulício da cidade para comungar ou reivindicar como minha a tranquilidade que não existe na inesgotável monotonia dos carros e do asfalto. A Fontes Pereira de Melo é como uma daquelas veias azuis e assustadoras que nos incham sob a derme e agora, enquanto escrevo,mora sobre o meu ombro direito e dela chegam uns tantos ecos (alguém que apita e esbraceja e amaldiçoa) tão insuficientes e irresolutos que não conseguem trair a serenidade que este espaço (ainda não te disse onde estou, pois não? Livraria Almedina, no Atrium Saldanha) consegue garantir, lembrando muito do que lês, do que vês e do que viveste, do que vivi - isso eu sei - contigo.
A cidade é mesmo aqui ao lado, tem como fronteira a fragilidade de um vidro, mas este espaço, parece, não lhe pertence. Imagina-te numa fábula urbana, Lisboa, Nova Iorque, Hamburgo ou Dharamshala em hora de ponta, sem carros nem gente nem riquexós, desaparecidos, sumidos, a cidade na sombra, vazia e uma música de Peter Gabriel exorcizando os espaços e nós os dois, libertos. A serenidade é a mesma. Tomo os livros por edifícios e por mundos e mantenho Peter Gabriel ou um outro que encaixe neste espaço com a mesma proporcionalidade e a mesma consistência, que embale como embala a frescura das páginas e das edições, que me tome de serenidade como me toma o desejo de continuar a escrever para ti até que a cidade adormeça.
Neste chão escuro, tomado de histórias e de palavras, tomar-te-ia com a ansia de quem precisa de ti para manter eterna este momento de quase letargia, de pax extrema em que nada mais parece mesmo importar. E com os dedos traçaria na tua pele uma trama de nós dois atá ao fim dos meus dias. Não sei se será perversão, mas se for,é de todas a mais bela. Á tua espera.

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